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quinta-feira, 24 de fevereiro de 2011

Egiptomania

O fascínio pelo Egito Antigo é algo inexplicável, diz professor de História antiga



Ir ao Egito era um sonho distante para qualquer pesquisador brasileiro solitário na década de 1970. Era uma época em que não se pensava em Internet, o luxo dos documentários via TV a cabo era inimaginável e a Egiptologia chegava até nós por intermédio de algumas livrarias, pequenos eventos e conversas. O Museu Nacional era um dos poucos lugares de “salvação”.

O fascínio pelo Egito Antigo é algo meio inexplicável, independente do mistério que o cinema e a literatura fantástica têm criado. O que acontece é que somos tocados na alma por alguma coisa. É um momento mágico quando verbalizamos nossa decisão: “É isso que vou estudar!” Em 1976, aos 15 anos, iniciei essa jornada.

Pesquisei muito, li tudo e fiz todos os cursos que podia sobre o tema. Meu fascínio não era a grandeza das pirâmides, mas as práticas religiosas; não era a riqueza dos faraós, mas a vida naquela época e a sua magia. Em 1995, quase vinte anos depois, fiz minha primeira viagem ao Egito.
Olhar as construções milenares no horizonte foi fascinante, e lembro bem que, quando estava diante da Grande Pirâmide, me senti engolido por sua “monumentalidade”. Os livros e documentários não têm como transmitir tamanha magnitude: é preciso estar lá. Dentro da pirâmide, muitas coisas me vieram à mente. Eu a conhecia, sabia onde estava tudo, podia explicar e falar das teorias sobre o monumento e suas câmaras. Mas os livros não fazem com que você sinta o toque na pedra, o frescor do ar, a dificuldade de se locomover, a sensação de grandeza, a atmosfera de paz e de aventura – é inevitável sentir-se um Indiana Jones.
Esta sensação se repetiu em várias partes do Egito. O complexo templário de Karnak – seguindo para Luxor, ao sul – é de deixar qualquer um desconcertado. Não só pela altura das colunas, mas pela dimensão e complexidade da área construída, a quantidade de capelas, templos e obeliscos. É fascinante sentir o clima e a atmosfera locais, que também não podem ser totalmente apreendidos nas fontes tradicionais de estudo.
Visitei sozinho a tumba do faraó Mer-em-Ptah, meu objeto de estudo na época. Ele era filho de Ramsés II e ficou conhecido pela “Estela de Israel”, inscrição na qual cita a conquista dos israelitas.  Enquanto descia, via as paredes com figuras e inscrições. É incrível poder ler parte delas e reconhecer divindades e cenas familiares. Estar só, descer dezenas de metros à meia-luz e chegar à câmara do sarcófago foi muito emocionante. Sentei em uma pedra diante do sarcófago e ali fiquei por quase uma hora.
Tentei, na medida do possível, levar estas sensações para os meus estudos e para as minhas aulas. Hoje em dia, em um projeto que estuda Egiptomania – o uso de elementos egípcios em outros contextos, desde a Antiguidade até a modernidade – e Egiptosofia – o uso das práticas religiosas egípcias pela modernidade –, tentamos compreender o fascínio que esta civilização desperta em nossas mentes. Será o mistério das lendas? Esse mistério é gerado pela mídia, pelo cinema, pela literatura ou pela grandeza dos monumentos? Será que existe algo que não conseguimos apreender? Talvez eu ainda esteja querendo encontrar uma resposta para o meu encanto pelo Antigo Egito.

Julio Gralha é professor de História Antiga e Medieval da Universidade Federal Fluminense (UFF-PUCG Campos) e autor de Deuses, faraós e o poder: legitimidade e imagem do Deus dinástico e do monarca no Antigo Egito (1550-1070 a.C.) (Barroso Produções, 2002).

Fonte: revistadehistoria.com.br

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